Tecnologia & confiança: a ascensão do deepfake1
22 Janeiro 2020 13:53
Os avanços tecnológicos abriram caminho para ferramentas que têm um potencial crescente de disseminar a desinformação nos próximos anos. Isso chama a atenção para o quanto os indivíduos, as empresas e as autoridades, em seu dia a dia, têm controle sobre suas imagens públicas.
Em nenhum outro exemplo, isso é mais evidente do que na onipresente ascensão de vídeos deepfake. Utilizando softwares avançados de geração de imagens por computador, mas surpreendentemente fáceis de serem usados, vídeos deepfake produzem gravações visuais e de áudio bastante realistas de pessoas dizendo ou fazendo qualquer coisa que o editor deseje.
A tecnologia para criar esses vídeos mentirosos está se tornando a cada dia mais difundida, com programas e aplicativos disponíveis para download e acesso a qualquer um que tenha um celular ou computador. Resumindo, estamos perdendo nosso poder de confiar em qualquer coisa – foto ou vídeo – que é compartilhado.
Aplicações do Deepfake
A tecnologia que alimenta a criação do deepfake não foi desenvolvida com intenção maliciosa; mas, ao contrário, para auxiliar na criação de material de apoio à produção cinematográfica, levando às telas a imagem de um ator que morreu enquanto as gravações ainda estavam acontecendo. Os fundamentos dessa tecnologia, no entanto, se espalharam e se simplificaram, permitindo que os usuários criem vídeos com intenções variadas, que vão de um efeito cômico a uma sabotagem direta.
O mais recente vídeo deepfake a ir parar nas manchetes globais não teve nenhuma intenção ruim. Na abertura do sitcom de família de 1990 Full House2, todas as faces dos atores foram substituídas pela do comediante Nick Offerman. Esses Offermans fakes apresentavam emoções e movimentos que eram semelhantes e consistentes com os maneirismos do vídeo original, embora Offerman não tivesse qualquer envolvimento na produção. Apesar da farsa óbvia, a “viralidade” do vídeo ilustra o impacto da tecnologia.
Outras aplicações assustadoras e recentes incluem discursos inteiros feitos aparentemente por líderes mundiais, incluindo a ex-primeira ministra do Reino Unido, Theresa May, o ex-presidente americano Barack Obama e o presidente russo Vladimir Putin. Mesmo para o espectador mais desconfiado, a natureza realista destes vídeos impressiona.
Construindo uma defesa contra o deepfake
Com a tecnologia do deepfake tão acessível, há o risco de cada pessoa ou empresa esteja a um vídeo malicioso de distância de um desastre. Será enormemente difícil construir confiança se cada vez mais vídeos deepfake turvarem o divisor de águas entre o fato e a ficção. Da mesma forma, compartilhar acidentalmente um vídeo deepfake tem o potencial de fazer o tiro sair pela culatra e arranhar o respeito e a confiança do público.
À medida em que a tecnologia do deepfake se espalha, no entanto, especialistas trabalham para criar outras ferramentas e métodos para contra-atacar. Uma solução potencial se apoia em dispositivos acionados quando qualquer pessoa que se posiciona em frente da câmera utiliza certos maneirismos e movimentos que bloqueiam a tecnologia CGI3 de utilizar a imagem como fonte de criação dos deepfakes.
O piscar de olhos, por exemplo, é um tipo de ponto fraco para a tecnologia deepfake. Enquanto humanos em vídeos reais piscam frequente e rapidamente, as piscadas do deepfake são muito mais vagarosas e menos frequentes. Não é impossível conceber que os tradicionais treinamentos de mídia para líderes empresariais e políticos irão evoluir e incluir um treino específico para piscar e linguagem corporal, como defesa contra a representação digital.
Enquanto essa defesa é claramente proativa, a natureza imprevisível da tecnologia irá exigir uma defesa reativa bem preparada também. Empresas de divulgação de notícias, sem dúvida, precisarão desenvolver planos pré-concebidos para correção e retratação da disseminação negligente de deepfakes. E por sua vez, profissionais de relações públicas serão chamados para desenvolver uma resposta convincente a crises se um vídeo deepfake ameaçar a sua marca.
Talvez, ainda mais importante, a ascensão de vídeos deepfake vai destacar a importância do monitoramento vigilante dos vídeos nas notícias e nas mídias sociais. Um processo vigoroso e completo de monitoramento permitirá a rápida identificação da desinformação e o envio de uma força-tarefa ágil para preservar a confiança pública.
Notas do tradutor
1Deepfake - Tecnologia que permite a manipulação de imagens de rosto e que usa técnicas de síntese visual e sons humanos, com o apoio de conhecimentos da inteligência artificial.
2 Full House – série de enorme sucesso da TV norte-americana do gênero comédia que estreou em 1987 e que narra os acontecimentos do pai viúvo, que convoca seu cunhado e seu melhor amigo para ajudar a criar as três filhas, depois que ele fica viúvo. Conhecida no Brasil como Três é Demais.
3 CGI - sigla para Computer Graphic Imagery, a computação gráfica.
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